O que é o esgoto? Por que tratá-lo?
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Autores: Isabela Batista e Lariza Azevedo
A demanda do ser humano por água em suas atividades do cotidiano é evidente: escovar os dentes, tomar banho, cozinhar, lavar vasilhames, dentre outras, são tarefas que realizamos todos os dias e que utilizam água. Como consequência da utilização de água, há a geração de esgoto. E para onde vai esse esgoto? De forma ideal, o esgoto deveria ser coletado em nossas residências, tratado e em seguida disposto adequadamente, contudo, no Brasil, metade do esgoto gerado não é coletado e nem tratado, e não recebe destinação adequada.
Esses números causam espanto, afinal, é consenso que o tratamento de esgoto é importante para o desenvolvimento econômico, a saúde pública e a proteção ambiental.
Além disso, o volume de esgoto gerado diariamente é um desafio em termos de gestão pública. Você sabe quanto esgoto você gera?
Existe uma forma simples de saber quanto de esgoto é gerado em sua residência. Pegue a conta de água de sua casa, no campo “Consumo Faturado”, verifique o volume de água consumido nos últimos trinta dias, divida o valor encontrado por 30 e você terá o consumo diário de água de sua residência, em seguida, multiplique esse número por 0,8. Pronto, você terá uma média diária de geração de esgoto por residência. Agora multiplique esse valor pelo número de casas da sua rua, do seu bairro… Imagine a quantidade de água que deve ser consumida e, consequentemente, a quantidade de esgoto gerado na sua cidade!
O que está presente no esgoto?
As características do esgoto são relacionadas aos usos aos quais a água foi submetida. Esses usos e a forma como são exercidos variam com o clima, hábitos da população, situação cultural, social e econômica, dentre outros fatores.
De forma geral, o esgoto sanitário contém aproximadamente 99,9% de água. A fração restante é de sólidos e está relacionada à presença de diversas impurezas, como matéria orgânica, bactérias, vírus, produtos químicos e metais pesados. É a fração relativa ao 0,1% restante que torna necessário o processo de tratamento de esgoto, de modo a enquadrar o efluente final à legislação ambiental relacionada.
Ademais, no esgoto são encontrados poluentes e detritos, que alteram significativamente as características quantitativas e qualitativas do esgoto que chegam às ETES, e que não deveriam ser lançados em peças sanitárias, tais como: presença excessiva de água de chuva, de detergentes (surfactantes), de óleo de cozinha, de fármacos e, também, de detritos diversos – cabelo, cotonete, absorvente, fio dental, algodão, lenço umedecido, ponta de cigarro, materiais plásticos, os quais não deveriam ser lançados nas peças sanitárias. Mas essa questão será tratada em um próximo blog. Fiquem ligados!
Como monitorar o esgoto?
Embora uma ampla variedade de compostos esteja presente na constituição do esgoto tipicamente sanitário, usualmente são monitorados apenas parâmetros indiretos que indicam o potencial poluidor do esgoto. Isso porque a determinação de dezenas de análises resultaria na oneração do processo de tratamento de esgoto sem necessariamente fornecer informações imprescindíveis para a adequada operação do processo.
A seguir temos os principais agentes poluidores encontrados no esgoto e seu potencial efeito poluidor.
Observe que os principais parâmetros utilizados para monitorar a qualidade do esgoto sanitário podem ser agrupados de acordo com as seguintes classes de poluentes contidos no esgoto:
- Sólidos.
- Indicadores de matéria orgânica.
- Nutrientes
- Organismos patogênicos e indicação de contaminação fecal.
Qual a importância do tratamento de esgoto?
O tratamento consiste em submeter o esgoto a processos que removem os poluentes (sólidos, matéria orgânica, nutrientes e patógenos). No corpo d’água, a matéria orgânica é convertida em produtos mineralizados inertes por mecanismos puramente naturais, caracterizando o fenômeno de autodepuração.
Em uma estação de tratamento de esgoto (ETE), os mesmos fenômenos básicos ocorrem, mas a diferença é que há a introdução de tecnologia, que tem como objetivo fazer com que o processo de autodepuração se desenvolva em condições controladas e em taxas mais elevadas.
De forma mais ampla, o tratamento de esgoto visa à proteção da saúde pública, do meio ambiente e dos recursos hídricos.
Saúde pública. A melhoria da saúde pública é uma das principais vantagens do tratamento de esgoto, já que o contato com esgoto pode causar diversas doenças, como cólera, hepatite A, febre tifoide, diarreia entre outras. A diarreia é uma das principais doenças infecciosas e, apesar dos avanços da medicina, ainda é a quinta causa de morte entre crianças com menos de cinco anos2,3. Estima-se que 432.000 mortes anuais por doenças diarreicas sejam atribuídas ao saneamento inadequado4. Neste contexto, o saneamento adequado fornece uma barreira eficaz à transmissão de patógenos, já que o tratamento de esgoto pode promover a sua remoção, evitando o contato com microrganismos causadores de doenças. Ademais, evita que a população tenha contato direto com o esgoto, contribuindo para a redução dos investimentos públicos na área da saúde.
Meio ambiente e recursos hídricos. Tratar o esgoto de forma a enquadrá-lo nos padrões para lançamento e de qualidade de um curso d’água proporciona o equilíbrio do ciclo hidrológico, uma vez que a água que foi coletada para consumo voltará ao manancial dentro dos padrões considerados adequados, não prejudicando, dessa forma, a capacidade de autodepuração do curso d’água e, consequentemente, não inviabilizando os seus usos previstos. O tratamento do esgoto também permite a produção de água para reúso em diferentes finalidades, como irrigação de plantações, lavagem de carros e limpeza de ruas, preservando os recursos hídricos, especialmente em situações de conflito pelo uso da água, devido à deterioração dos mananciais ou pelo desequilíbrio natural entre oferta e demanda, assim como em períodos de escassez hídrica. Ademais, os subprodutos do tratamento de esgoto – biogás e lodo, também podem ser aproveitados. Leia os nossos blogs sobre esses assuntos.
Equidade social. Estima-se que mais de 3,1 bilhões de pessoas em todo o mundo adotam instalações sanitárias inadequadas (latrinas, fossas e outros)3. A população mais vulnerável economicamente é a que mais sofre com a falta de coleta e tratamento de esgoto, refletindo a desigualdade econômica do Brasil. Vale ressaltar que investimento em coleta e tratamento de esgoto gera aumento na qualidade de vida, sensação de pertencimento, além da valorização imobiliária de áreas periféricas. Além disso, acesso ao tratamento de esgoto é um direito humano e faz parte dos objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS). O ODS 6 tem o objetivo de garantir disponibilidade e manejo sustentável da água e saneamento para todos.
Portanto, tratar o esgoto é fundamental para proteger a saúde pública, preservar o meio ambiente, conservar os recursos hídricos e melhorar a qualidade de vida das pessoas, além de ser um direito garantido por lei que deve ser assegurado à todas as pessoas.
Ficou com alguma dúvida ou quer saber mais sobre como tratar o esgoto gerado nas nossas casas?
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Notas:
1von Sperling, M. Introdução à qualidade das águas e ao tratamento de esgoto. 3. ed. Belo Horizonte: Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental. Universidade Federal de Minas Gerais, 2005. 452 p. (Princípios do tratamento biológico de águas residuárias, v.1).
2A systematic review and meta-analysis of pathogen reduction in onsite sanitation systems. Disponível em: <https://doi.org/10.1016/j.wroa.2023.100171>
3UNICEF and WHO. Progress on Household Drinking Water, Sanitation and Hygiene 2000 – 2017. Special Focus on Inequalities United Nations Children’s Fund (UNICEF) and World Health Organization (WHO), New York (2019).
4Diarrheal disease, sanitation, and culture in India, Social Science & Medicine. Disponível em: <https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2022.115541>